Portuguese English French German Italian Russian Spanish
Início > Noticias > ABL na mídia - Terra - Flup: 1ª mulher negra na ABL, Ana Maria Gonçalves celebra conquista e 20 anos de 'Um defeito de cor'

ABL na mídia - Terra - Flup: 1ª mulher negra na ABL, Ana Maria Gonçalves celebra conquista e 20 anos de 'Um defeito de cor'

 

Ana Maria Gonçalves chega à Flup 2025 como uma das presenças mais aguardadas da programação deste festival que, há 15 anos, celebra as literaturas ditas periféricas.  Autora de Um defeito de cor, obra já consagrada como um verdadeiro clássico da literatura afro-brasileira, ela celebra sua entrada, em julho deste ano, na Academia Brasileira de Letras, tornando-se a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira na instituição.

Questionada sobre como foi participar dessa "festa", depois de 128 anos de ausência feminina na vetusta instituição, Gonçalves afirmou que acha "que, ao mesmo tempo, é motivo da gente comemorar, porque a gente precisa ocupar esses lugares". "Eu acho que os lugares onde são tomadas decisões que influenciam a vida da gente, eles devem ser ocupados proporcionalmente à parcela da população envolvida no assunto, e ali é uma casa que defende a língua, o português, ou seja, é uma casa, deveria ser uma casa do povo", sublinhou.

"Então, ao mesmo tempo que a gente comemora isso, eu acho que é o momento exatamente de se perguntar por que só agora? Por que a gente [as pessoas negras, e, sobretudo, as mulheres pretas] ainda não chegou em todas as instituições onde a gente deve estar?", questionou Gonçalves, depois de uma longa fila de dedicatórias do seu livro Um defeito de cor, após sua participação no evento com o cineasta ítalo-ganês Fred Kuwornu, parte da programação da Flup.

A escritora reforça que "não basta" ser a primeira mulher negra a se tornar "imortal" e acrescenta que sua presença deve provocar mudanças na ABL. "Tem que ser, senão acho que nem vale a pena (...). Eu acho que a academia também começa a se questionar nesse sentido, né? Por que isso está se falando tanto? Qual a importância disso? O que implica? Então, se não for para não mudar, não vale a pena."
"Embranquecimento" x memória

Em sua conferência, Gonçalves evocou Machado de Assis, fundador da Academia Brasileira de Letras, lembrando que ele era afrodescendente, embranquecido pelas circunstâncias, e relacionou essa história ao título e à narrativa de seu livro Um defeito de cor. Perguntada se ainda se sente embranquecida pelo olhar como mulher negra em posição de poder, ela respondeu: "acredito que a minha negritude é ainda muito questionada ainda em alguns lugares".

Sobre os 20 anos de Um defeito de cor, obra que se consolidou como marco da literatura afro-brasileira, Ana Maria Gonçalves relembrou o impacto inesperado do livro. "Não tinha a menor ideia, a gente não tem controle da recepção. Então, enfim, eu escrevo o que eu sempre falo, eu escrevi um livro que eu queria ter lido e não achei. E aí eu escrevi, então foi pra mim."

A autora explica que, ao partir de sua experiência pessoal, acabou alcançando uma dimensão coletiva. "Eu acho que nesse sentido o particular se torna universal. Não é quanto mais você particulariza, mais você vai encontrar pessoas que estão ali naquela mesma situação. Então acho que ele repercutiu muito numa sociedade que, para se entender, precisa entender essa parte da história", sintetizou.

Ela observa que faltava um romance que colocasse a história da escravidão em diálogo com o presente. "Eu não digo nem que não existia um romance nesse sentido, não existia essa história, ela já tinha sido contada, só que eu acho que causou uma intersecção de várias coisas, um momento interessante onde a sociedade estava começando a discutir cotas e para isso precisava entender o racismo vindo da escravidão e uma grande parcela da população que nunca tinha se lido."

O livro, segundo Gonçalves, encontrou eco sobretudo entre mulheres negras: "Eu acho que elas também se entenderam e se viram ali da mesma forma que eu. Então é uma confluência que deu bem", analisa.

Sobre a presença de mulheres negras na literatura e na Academia Brasileira de Letras, Ana Maria Gonçalves celebrou a força de nomes como Conceição Evaristo e Leda Maria Martins, refletindo também, com humor, sobre a tradição mineira que as conecta.

"O Millôr Fernandes, que foi um dos meus grandes padrinhos, ele fala que 'mineiro nunca é o que parece, sobretudo quando parece ser o que é'. Nós somos mulheres quietinhas, caladinhas, mas enquanto isso a gente vai produzindo muita coisa. Eu acho que, de todos os estados brasileiros, os mineiros são maioria na Academia Brasileira de Letras. A gente ainda vai fazer a Inconfidência acontecer em algum momento."

Sobre diásporas negras e ancestralidade, Ana Maria Gonçalves destacou a potência simbólica do espaço que abriga a Flup. "Esse viaduto de Madureira é interessante, porque hoje ele é mais lembrado no Rio de Janeiro por um grande baile charme. Baile de música negra que acontece aqui, de gente da periferia, então é muito bonito ver também a literatura e outros tipos de arte, como a poesia, como a performance, conviver todo mundo aqui dentro, porque a gente está contando a nossa história, então isso é bonito de ver."

Matéria na íntegra: https://www.terra.com.br/noticias/brasil/flup-1-mulher-negra-na-abl-ana-maria-goncalves-celebra-conquista-e-20-anos-de-um-defeito-de-cor,ff48063c49a768807797c6f53fda61f04ukwt5v9.html?utm_source=clipboard

24/11/2025