Portuguese English French German Italian Russian Spanish
Início > Noticias > ABL na mídia - O Globo - Ana Maria Gonçalves toma posse na ABL com fardão 'portelense' e esperança de 'abrir portas' para outras mulheres negras

ABL na mídia - O Globo - Ana Maria Gonçalves toma posse na ABL com fardão 'portelense' e esperança de 'abrir portas' para outras mulheres negras

 

A Academia Brasileira de Letras (ABL) viveu uma noite histórica nesta sexta-feira (7), com a posse da escritora Ana Maria Gonçalves. Eleita em julho, ela agora ocupa oficialmente a cadeira 33 do quadro de acadêmicos, sucedendo o filólogo Evanildo Bechara. Autora do aclamado “Um defeito de cor”, Gonçalves é a primeira mulher negra (e apenas a 13ª mulher) a integrar a instituição em seus 128 anos de existência. Aos 54 anos, também é a mais jovem entre os atuais acadêmicos.

Em uma fala antes do seu discurso, Gonçalves disse que a entrada de uma mulher negra é motivo de comemoração, mas também uma oportunidade de reflexão.

— Por que só agora? —indagou a nova imortal. — Por que 128 anos de espera se tínhamos uma cadeia de tantas outras autoras negras que, com certeza, já teriam capacidade e vontade de estar aqui dentro e ainda não estiveram? Espero que isso abra portas para que eu não seja a única.

Em um momento simbólico, Gonçalves apresentou o fardão confeccionado por artesãos da escola de Portela. É a primeira vez que uma agremiação de samba é responsável pelo fardão de uma acadêmica. O mais famoso livro de Gonçalves, “Um defeito de cor”, inspirou o enredo da Portela em 2024, ano em que a escola conquistou o Estandarte de Ouro.

— O processo de confecção do fardão é muito caro, e eu quis tirar o monopólio das pessoas que tradicionalmente o faziam e levar para a escola de samba, que tem uma importância enorme na minha trajetória — diz a escritora. — A Portela deu uma visibilidade para “Um defeito de cor” que nenhuma festa ou evento literário deu. Dentro dos barracões, há artistas incríveis, e simbolicamente era importante que eles estivessem representados aqui.

Convidada para fazer o discurso de recepção de Gonçalves, a historiadora Lilia Schwarcz se disse “emocionada” com o convite. Em sua fala, a ocupante da cadeira 9 da ABL destacou a importância de “Um defeito de cor”, um clássico contemporâneo que acompanha a movimentada trajetória Kehinde, uma ex-escravizada africana, idosa, que viveu no Brasil durante a maior parte do século XIX. Ao que tudo indica, Kehinde foi mãe do abolicionista Luiz Gama.

— Nunca o livro de Ana foi tão atual como nos dias de hoje, com as chacinas nos complexos do Alemão e da Penha — disse Lilia em seu discurso. — Kehinde é uma mãe que viu um filho morrer e outro desaparecer. Simbolicamente, ela é mais uma das muitas mães negras brasileiras enlutadas, que seguem lutando

Lilia desejou boas-vindas à nova acadêmica:

— Que você entre nessa ABL trazendo toda uma diáspora negra, africana e afrobrasileira que fez da ficção literária uma forma de memória, cobrindo lacunas dessa história ainda tão ocidental e masculina: presente nessa e em outras instituições — disse. — Que você chegue abrindo portas e nos ajude a imaginar um país mais digno para todas e todos nós.

Ana Maria Gonçalves lembrou o processo de exclusão de deliberado de minorias, como as candidaturas negadas de Julia Lopes de Almeida e Amélia Beviláqua. Provocou emoção na sala ao citar a campanha da escritora negra Conceição Evaristo por uma vaga na ABL em 2018. Na época, ela acabou não se candidatando, mas provocou um debate sobre representatividade na instituição. Presente entre os convidados, Conceição levantou-se e foi bastante aplaudida.

— Independente do resultado, a candidatura de Conceição fez com que a ABL olhasse para si e diante da sociedade finalmente percebesse o quão homogênea ainda era, o quanto falhava em representar dentro de seus quadros todas as línguas faladas pelo nosso povo — disse Gonçalves.

O presidente da ABL, Merval Pereira, reforçou o peso da autora na literatura e o que sua chegada representa para a instituição:

— A Ana Maria Gonçalves é uma grande escritora brasileira, autora de um livro icônico, e ela representa a diversidade da cultura brasileira. Tudo isso faz com que ela seja muito bem-vinda à Academia

Matéria na íntegra: https://oglobo.globo.com/cultura/noticia/2025/11/07/ana-maria-goncalves-toma-posse-na-abl-com-fardao-portelense-e-esperanca-de-abrir-portas-para-outras-mulheres-negras.ghtml

07/11/2025