Parte da obra literária de José Sarney volta às livrarias com reedições de três títulos marcantes em sua trajetória: “O dono do mar”, “Saraminda” e “A duquesa vale uma missa” (editora Principis, selo da Ciranda Cultural). O lançamento das novas edições no Rio de Janeiro acontece nesta quinta-feira, 27 de novembro, a partir das 16h, em uma sessão nobre na Academia Brasileira de Letras (ABL), que terá presença do autor e uma palestra do acadêmico Domício Proença Filho. Na sequência, haverá uma sessão de autógrafos.
Afastado da vida pública desde 2014, Sarney costuma dizer que a política foi seu “destino” e a literatura, a sua vocação. Agora, aos 95 anos, o maranhense revisita o seu “noivado” com a ficção.
— Sendo eu autor de uma bibliografia de 120 títulos, com 168 edições registradas, além de terem sido objeto de diversas teses universitárias, no Brasil e no exterior, um dos poucos autores brasileiros incluídos na FOLIO, da Galimard, na França, considerei que, nessa altura da minha vida, como um político, neste momento devia ir atrás de renovar os meus leitores para uma nova geração, depois de ter sido festejado no mundo inteiro nesta minha longa vida — diz o ex-presidente da República e ocupante da cadeira 38 da ABL desde 1980.
Duas vertentes
A Ciranda Cultural também deve publicar outros três livros de Sarney, incluindo uma antologia de poética.
— Vejo tudo isso como uma consagração da minha obra nas duas vertentes da minha vida na política e na literatura — diz o autor.
Uma de suas obras mais conhecidas, “O dono do mar” (1995) mergulha no universo mítico dos pescadores do Maranhão, entrelaçando realismo e ancestralidade. A natureza assume papel de personagem. Traduzido para 12 idiomas, o romance ganhou adaptação para o cinema e recebeu elogios do antropólogo Claude Lévi-Strauss (1908-2009). “O que José Sarney nos faz tão maravilhosamente ver é o duplo aspecto sob o qual pode nos aparecer o mundo sobrenatural: muito distante no espaço ou muito distante no tempo”, escreveu o francês.
Já “Saraminda”, publicado em 2000, é um exemplo da forte presença feminina na obra de Sarney. Misturando magia e pesquisa histórica, o enredo acompanha uma hipnotizante prostituta pelos garimpos da Guiana Francesa e do Amapá no século XIX.
Por último, “A Duquesa vale uma missa” (2007) acompanha um protagonista obcecado pela Duquesa de Villars, uma mulher que ele só conhece pelo retrato de um quadro renascentista. A nova edição conta um final alternativo, que acrescenta camadas à trama original.
— Como no Brasil a leitura que se fazia da minha obra era mais política do que literária, eu me dediquei à divulgação dos meus livros no exterior, pelas editoras Hachette e selos da Gallimard — diz o ex-presidente.
Presidente da Academia Brasileira de Letras, o jornalista Merval Pereira diz que o relançamento é uma celebração da literatura do escritor e político.
— Sarney é o decano da ABL, onde está há 45 anos. Já era um romancista importante. A vida política exitosa ofuscou a literária, levando-o à presidência da República. Hoje, relançando alguns de seus romances, comemora também seu lado literário.
Realismo maravilhoso
— Por muito tempo, a imagem do escritor foi abalada pelo protagonismo de sua carreira política, que acabou se sobrepondo — diz o poeta, professor e pesquisador em língua portuguesa e literatura brasileira. — Estes três romances são altamente representativos da literatura brasileira e deveriam ser mais valorizados. Eles se inscrevem nos espaços da tradição do romance realista do século XIX, mas ultrapassam essas esferas, criando conexões com a tradição latino-americana do realismo maravilhoso do século XX.
26/11/2025
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