Portuguese English French German Italian Russian Spanish
Início > Artigos

Artigos

  • A Quarta ou a Quinta

    A COMEÇAR pelos fenícios, as potências mundiais sempre foram potências navais. Com o fim da Idade Média, Portugal, Espanha, Holanda, França e Inglaterra dominaram os mares. Portugal foi ultrapassado no final do século 16 pela Holanda, que chegou com seus navios leves e velozes. Os ingleses, com a novidade das fragatas com duas fileiras de canhões, levaram de roldão portugueses, espanhóis e holandeses, e nasceu o formidável Império Britânico. Hoje, 90% do comércio mundial circula pelos mares. Os Estados Unidos distribuíram suas frotas em todos os pontos estratégicos dos oceanos. A Segunda e a Terceira Frotas são responsáveis pela defesa dos interesses americanos nos oceanos Atlântico e Pacífico, respectivamente. A Quinta Frota, que cobre o golfo Pérsico, o mar Vermelho e o mar Arábico, acompanha as tensões do Oriente Médio e já chegou a contar com nada menos do que cinco porta-aviões americanos, em 2003. A Sexta Frota é baseada no Mediterrâneo, e a Sétima, no Japão. A Primeira Frota foi desativada em 1973. E agora os EUA querem reativar a Quarta Frota, que ficará responsável pelo Atlântico Sul. A China, que sempre foi uma potência terrestre, tornou-se hoje uma potência naval. Uma de suas tarefas é proteger suas rotas de comércio, especialmente as do petróleo e de seu fluxo gigantesco de exportação. Patrulha permanentemente os 800 quilômetros do estreito de Malaca, hoje infestado de piratas modernos. O aspecto econômico-comercial certamente também pesou na decisão americana de reativar a Quarta Frota no Atlântico Sul, com a perspectiva de que a região se torne um dos grandes centros produtores de petróleo, devido às recentes descobertas de jazidas. Em 1986, o meu governo propôs à ONU a criação de uma Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul. Esta proposta, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 27 de outubro daquele ano, por meio da Resolução n.º 41/11, torna o Atlântico Sul uma zona de paz, livre de armas nucleares. Esta resolução do Brasil teve 124 votos a favor e um único voto contra, o dos Estados Unidos. Nossa preocupação continua válida. Sou um pacifista e hoje, como ontem, sei que ninguém impedirá navios americanos de navegar em todos os mares internacionais, mas não posso concordar que transitem por aqui com armas nucleares. E todos eles as têm. Essa deve, objetivamente, ser a posição do Brasil: ver cumprida a resolução aprovada pela ONU em 1986. Necessitamos desta clara garantia. No mais, eles não precisam de Quarta. Já têm a Quinta, a Sexta e até o Sábado de Aleluia.

  • O Dédalo do Jânio

    FOI A JUSTIÇA que tornou possível a democracia. No século 13, em 1215, com a Magna Carta, os ingleses iniciaram a construção do direito moderno. Foi o rei João que pactuou a primeira declaração de direitos, abandonando a noção de direito divino dos reis, obrigando-se a respeitar a liberdade pessoal, a propriedade e a prerrogativa de ser julgado por uma Justiça isenta. É o embrião dos direitos fundamentais.

  • A Quarta e o boi

    DOIS ASSUNTOS me despertaram especial atenção nesta semana. O primeiro é uma velha história cujo resultado já dissequei várias vezes. O fato de a Venezuela querer ser potência militar desencadeou duas conseqüências esperadas: 1º) Uma corrida armamentista, com o crescimento de 55% no orçamento militar da América do Sul, atingindo US$ 38,4 bilhões em 2007, dinheiro que tanta falta faz aos programas sociais; 2º) Os Estados Unidos não ficaram de braços cruzados e logo reativaram a sua Quarta Frota. Denunciei que isso iria acontecer. Anos atrás, Menem quis que a Argentina fosse associada da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Eu, à época, protestei e uma reação geral foi desencadeada, sepultando aquela aventura.

  • A hora e a vez das listas

    HOUVE UM tempo em que a legislação eleitoral não permitia a presença de soldados nas proximidades das seções eleitorais. Procurava-se proteger os eleitores contra a coação do poder público. Agora, a discussão é como colocar a polícia dentro das seções eleitorais e como proteger os candidatos para que possam ter o direito de ir e vir. Nenhuma confissão maior do que esta, da falência e da impotência do poder público, acuado pelo crime organizado, gerando um clima de medo e insegurança na sociedade.

  • Classe média numa boa

    Entre as notícias de crise no mundo inteiro, com os Estados Unidos comandando os receios de recessão, o Ipea e a Fundação Getulio Vargas trazem as boas notícias de que a classe média já é maioria na população brasileira, chegando a 51,89% das pessoas, e que 3 milhões de brasileiros deixaram a faixa da pobreza absoluta. É uma importante etapa vencida e uma grande mudança, causada pela queda do desemprego, pelo aumento do número de trabalhadores com carteira assinada, pela melhoria do salário mínimo e pelos grandes programas sociais.

  • Marta e a Petrosal

    Em tempos de Olimpíadas, nenhum assunto pode deixar de estar interligado, entre jogos e aconte-cimentos. Assim é o imbróglio entre Rússia e Geórgia – por sinal a terra onde nasceu Stálin –, violando uma lei dos gregos, que mandava suspender todas as guerras durante os Jogos Olímpícos, assim como uma regra da xaria islâmica diz que um homem pode separar-se da mu-lher desde que não seja no período menstrual.

  • Sinal vermelho apagado

    NÃO HÁ SANTOS nesse episódio do confronto entre a Geórgia e a Rússia. O Cáucaso, onde se encontra a República da Geórgia, é uma colcha de retalhos de etnias, e suas altas montanhas sempre serviram de fronteira natural entre impérios rivais que convergiam naquele canto do mundo, como a Pérsia, os otomanos e a Rússia. Ali, o argumento da força sempre foi mais ouvido do que os apelos de paz, e a história eslava é uma sucessão de relatos sangrentos, como mostra Hélène Carrère d’Encausse no seu famoso livro sobre o sangue na história da Rússia.

  • Chimpanzés e o bóson

    O Superior Tribunal de Justiça julga um habeas corpus que tem como relator o ministro Herman Benjamin, a maior autoridade brasileira em direito ambiental, para conceder liberdade a Lili e Megh, dois chimpanzés que viajaram clandestinos do zoológico de São Paulo para o de Fortaleza, sem licença do Ibama. A discussão é se o direito de ir e vir deve ser só de humanos ou se estende a animais. Os impetrantes argumentam com o direito à vida e os bichos vivem. Há jurisprudência: o ministro Magri, nos anos 90, disse que "cachorro também é gente". Enfim, o abacaxi está nas boas mãos do ministro Herman.

  • As aves, menos cantos

    Estava preparado para entrar no assunto do dia, a crise financeira que fez os Estados Unidos voltarem a Lord Keynes e negar o neoliberalismo, com US$ 2 trilhões de dólares destinados a salvar bancos e corretoras, quando encontro a notícia, para mim, pior, que é o alerta da Sociedade Espanhola de Ornitologia de que os pássaros do mundo estão ameaçados e que cada vez menos cantos ouviremos – no Maranhão, diríamos gorjeios.

  • Vinte anos da Constituição de 1988

    A CONSTITUIÇÃO de 1988, cujos 20 anos de promulgação estamos fazendo memória, nasceu -fato pouco percebido pela sociedade brasileira- de amplo acordo político, o intitulado "compromisso com a nação". Esse pacto, talvez o mais importante de nossa história republicana, ensejou a eleição da chapa Tancredo Neves/José Sarney, por intermédio do Colégio Eleitoral, e tornou possível, de forma pacífica, a passagem do regime autoritário para o Estado democrático de Direito. Como toda obra humana, é evidente, uma constituição tem virtudes e imperfeições. As virtudes decorrem do contexto histórico em que são discutidas e votadas. No período 1987/ 1988, aspirava-se, antes de tudo, à restauração plena das liberdades e garantias individuais e à edificação de uma democracia sem adjetivos.

  • Sem olhos em Gaza

    A MINHA GERAÇÃO leu um escritor inglês, quase cego, que passou grande parte de sua vida nos Estados Unidos, onde realizou uma grande obra. Chamava-se Aldous Huxley. Hoje ninguém mais edita os grandes romancistas dos anos 30, que ficaram restritos às universidades e cursos de letras. Huxley escreveu um livro com o título ‘Sem Olhos em Gaza’, que nada tem a ver com Gaza. É um volume de mais de 600 páginas que, como tudo o que ele escrevia, tinha muito menos de trama novelesca e mais de dissertações humanistas. Não é o seu melhor livro, que todos reconhecem ser ‘Admirável Mundo Novo’, obrigatório nas nossas leituras.

  • Um papagaio de Nabuco

    A questão da raça negra ficou muito tempo fora dos temas nacionais. Poucos homens públicos dela tratavam. O interesse era mais histórico e científico. Afonso Arinos foi o novo Nabuco no despertar do que significava o sofrimento e a segregação a que estavam submetidos.A Lei Afonso Arinos trouxe o tema ao público. Tornou crime a discriminação racial e fez ver o negro como a população mais marginalizada do país. Juntei-me à sua visão e fui do grupo restrito que sempre achou ser a mancha da escravidão a pior de nossa história e que a Independência, como dizia José Bonifácio, não se completou porque não extinguimos a escravidão e não resolvemos a questão indígena, mantendo com esses a velha fórmula colonial do enfrentamento, responsável pela sua dizimação. Os escravos transformados em homens livres ficaram sem trabalho e sem destino, párias que se arrastaram por décadas, sendo até hoje entre os pobres os mais pobres.

  • O ponto G e o ponto zero

    Muitas teorias existem sobre o ponto G e a maior ambição de todos é encontrá-lo. É o máximo do máximo. Em economia, em tempos de crise, o ponto G é o ponto zero dos juros.

  • O amigo e o democrata

    BUENOS AIRES - Sou tomado nesse momento por um duplo sentimento de perda: a do amigo e a do homem de Estado. Raúl Alfonsín foi, sem dúvida, uma das maiores figuras humanas que conheci, e foi também o homem que abriu, com sua coragem, a integração latino-americana.

  • Raúl Alfonsín: o amigo e o democrata

    Sou tomado nesse momento por um duplo sentimento de perda: a do amigo e a do homem de Estado. Raúl Alfonsín foi, sem dúvida, uma das maiores figuras humanas que conheci. E foi também o homem que abriu, com sua coragem, a integração latino-americana. Tudo o que fizemos para inverter o processo histórico de hostilidade entre Brasil e Argentina, transformando-o num processo de integração, não teria sido possível sem Alfonsín.