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ABL na mídia - Matinal - Ana Maria Gonçalves no Ling

 

A escritora destacou que durante a pandemia começou a pensar no processo de envelhecimento e também se deparou com a chegada da menopausa, um processo, segundo ela, que faz as mulheres pensarem no tempo a partir de outro métrica. A sua iniciação numa casa de candomblé também afetou a sua noção de tempo. Ela fez referência ao Iroco, árvore sagrada que liga céu, terra e orixá da ancestralidade. Citou uma passagem sobre esse aspecto de Um defeito de cor. O ponto alto dessa fala em tom de reflexão em voz alta talvez tenha sido esta frase de Leda Martins: “Vanguarda é o espírito mais tradicional da ancestralidade”. Como diria Ailton Krenak, o futuro é ancestral.

Ana Maria Gonçalves não costurou respostas nem unificou os pensamentos e citações externados. Parecia deixar-se levar pela espiral do tempo, esse monstro invisível que nos atrai para o abismo desde que nascemos. A cultura ocidental tentou capturar o tempo em relógios e calendários. Acabou encurralando o ser humano numa linearidade que empobrece o imaginário e desampara cada ser no mundo. Quando o tempo não é circular, nem se espirala, o passado não volta como voz do futuro. Fica-se sem o “enraizamento dinâmico” necessário ao posicionamento relativo num espaço de transformações permanentes.

Em determinado momento, Ana Maria tentou lembrar alguns nomes do seu livro e não conseguiu. Então contou que nunca o releu e não se lembra de tudo o que escreveu. Há na sua literatura um tom de evocação e outro de iniciação. Ela mesma parece se colocar assim boa parte do tempo, reconhecendo inspirações e declarando-se em processo de conhecimento. O tempo não passa, mas ele nos vê passar sem descanso. Tempo é poder, abstração, visão de mundo, cosmogonia e realidade.

Tempo pode ter a ver com destino, lugar no mundo, fluxo, eterno retorno da “silente legenda”, como diz Eliot em seus famosos versos. O tempo de Ana Maria Gonçalves, porém, tem outra medida, assim como seu olhar tem outra epistemologia, nagô, em grande parte, embora ela tenha dito em sua palestra que se tivesse lido Leda Martins antes de escrever Um defeito de cor, teria dado mais espaço em seu vasto romance sobre a história da negritude no Brasil ao imaginário banto.

Num parêntese ao que falava, Ana Maria lamentou criticamente que autoras americanas se apropriem de conceitos criados por intelectuais negras brasileiras e citou a campanha de Conceição Evaristo para a Academia Brasileira de Letras como base para o sucesso da sua. Para ela, a ABL deu-se conta de que não estava representando a língua pela qual deve zelar, a língua falada na diversidade da cultura brasileira.

Matéria na íntegra: https://www.matinaljornalismo.com.br/matinal/colunistas-matinal/juremir-machado/ana-maria-goncalves-no-ling/

22/10/2025