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O macho na cadeia, sem suas redes sociais

 

Conhecido por seu individualismo radical —"Não assino manifestos, não pertenço a comitês, não ando em multidão"—, Nelson Rodrigues dizia que às vezes se sentia como um "Robinson Crusoé sem radinho de pilha". Nos anos 1960, o radinho de pilha era uma espécie de celular, que se levava para o estádio ou para a rua a fim de escutar o futebol. Uma ilha deserta sem radinho devia ser o máximo do isolamento.

Hoje, o isolamento é o sujeito se ver privado do celular, da internet e das redes sociais. É o caso dos condenados à prisão. Para controle da segurança, da execução penal e da prevenção de novos crimes, o prisioneiro precisa ser privado de qualquer contato com o mundo exterior. Para isso, é confinado numa cela, sozinho ou com outros presos, podendo receber no máximo a visita de parentes ou de seu advogado. A posse de um celular na cela e a possibilidade de continuar falando com suas redes sociais equivaleria ao sujeito estar solto, nas ruas, de mãos nos bolsos e assobiando no azul, ao alcance de asseclas, cúmplices e seguidores. Que prisão seria essa?

O que os asseclas, cúmplices e seguidores de Bolsonaro temem é que, quando se der sua inevitável condenação e ordem de prisão pela Justiça, ele será privado das redes que são a sua principal ferramenta de comunicação. É por elas que Bolsonaro fomenta a instabilidade institucional, dissemina fake news e conspira com seus golpistas.

Na segunda-feira (2), a colunista Malu Gaspar, de O Globo, referiu-se ao que os bolsonaristas estão temendo para Bolsonaro: a "morte civil", provocada pelo "exílio virtual" por não poder se comunicar com seus zumbis. Mas é isso que o imbrochável Bolsonaro não deveria temer. Afinal, Lula também foi preso e passou 580 dias numa cela de 15 m2, num quartel em Curitiba, com uma cama de solteiro, um armário, uma mesinha, uma cadeira e uma TV aberta. Sem celular, sem internet, sem redes sociais. E aguentou firme.

O intrépido e destemido Bolsonaro não se permitirá ser menos macho do que Lula, não?

Folha de São Paulo, 05/06/2025