Li outro dia uma frase do compositor americano Aaron Copland (1900-90) sobre a música gravada em disco. Para Copland, ela não fazia justiça à música ao vivo, interpretada em teatro por uma orquestra de 80 figuras. E pensou encerrar o assunto com "Ouvir um disco é como ir para a cama com um retrato" (não com uma pessoa de verdade). O autor do balé "Billy the Kid", de 1938, devia estar se referindo a algum momento primitivo da gravação, anterior à alta fidelidade, ao estéreo e ao Dolby.
De fato, os primeiros 50 anos da música gravada, que coincidiram com os primeiros 50 do século 20, foram de amargar. Os discos de 78 r.p.m., gravados na cera, não registravam direito os agudos, os baixos eram abafados e o material de que se compunham era grosseiro e chiava. Mas, em meados dos anos 1950, com o advento da fita magnética, da vinilite, do microssulco, da rotação em 33 1/3 r.p.m. e de inúmeros outros recursos, já se podia dizer que a música gravada pelo menos empatava em qualidade de som com a executada ao vivo.
E não demorou de certa forma a superá-la, como nas gravações em double tracking do grupo francês Les Double Six e em multitracking do trio vocal americano Lambert, Hendricks & Ross. O que eles pareciam fazer em disco era impossível no palco —cantar em dobro ou várias coisas ao mesmo tempo. Os próprios Beatles, em 1966, pararam de se apresentar em público não só pela gritaria das fãs, mas porque certos efeitos dos arranjos de George Martin eram impraticáveis fora do estúdio.
Mas o importante para mim é que, com os modernos recursos de recuperação sonora, gravações históricas, como as de Louis Armstrong, nos anos 1920, Carmen Miranda, nos anos 1930, e outros soam hoje como seus contemporâneos nunca as escutaram. Confirma algo de que sempre desconfiei: a gravação já era boa, a reprodução é que era deficiente. Hoje, com a IA, a música gravada supera não só a música ao vivo, mas permite que até os mortos ressuscitem. Vide Elis Regina cantando coisas que nunca gravou.
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