Quando a política se mistura com as decisões jurídicas, não há chance de dar certo. Ontem, instituições brasileiras depararam com impasses nas relações internacionais do Brasil que evidenciaram erros cometidos anteriormente.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes deu mais uma prova de que decide mais com o fígado que com a legislação pertinente. Como o governo da Espanha recusou-se a repatriar ao Brasil o blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio, foragido da polícia brasileira e acusado de ter tido comportamento radicalizado no seu blog para desacreditar as urnas eletrônicas, Moraes, alegando uma reciprocidade inexistente, liberou um cidadão búlgaro, traficante internacional de drogas, preso com 52 quilos de cocaína — a Espanha queria julgá-lo lá.
Contrariado com o fato de a Justiça espanhola não considerar crime o que ele considera, simplesmente mandou o traficante para casa com uma tornozeleira eletrônica. Ora, se uma decisão esdrúxula dessas não é eivada de espírito de revanche, não sei o que mais é. Noutro caso, que envolve diretamente o presidente Lula, a situação é ainda mais grave.
Dois ex-presidentes do Peru já foram presos por causa da Operação Lava-Jato — e um outro, Alan García, se suicidou quando viu que ia para a cadeia. Todos estão envolvidos no mesmo esquema da empreiteira brasileira Odebrecht, hoje renomeada Novonor, de financiamento a campanhas políticas em toda a América Latina, e foram condenados em seus países, em decorrência da investigação iniciada na Justiça brasileira.
A mulher do ex-presidente peruano Ollanta Humala, preso por ter recebido propina do esquema da empreiteira, pediu asilo político ao Brasil, dizendo-se perseguida. O governo brasileiro não apenas concedeu o asilo, como mandou um avião da FAB pegar a ex-primeira-dama, fundadora do partido político do ex-presidente. Longe de ser apenas uma dona de casa, ela é uma política ativa.
O grave não é apenas aceitar dar proteção a uma acusada de corrupção. O pior é que Marcelo Odebrecht, à época do escândalo revelado pela Operação Lava-Jato, afirmou em sua delação que o pedido para que US$ 3 milhões fossem doados à campanha de Humala foi feito pessoalmente pelo então presidente Lula. Só no Brasil, origem da investigação, decidiu-se que não houve nada, todos os processos foram anulados ou prescreveram. No resto da América Latina, ex-presidentes de Peru, do Panamá e El Salvador foram presos.
É um mau sinal o Brasil aceitar dar asilo a acusados de corrupção — como Nadine Heredia, mulher do presidente peruano indiciada — no mesmo movimento que aconteceu aqui, envolvendo até o presidente Lula. Aqui alegam que houve abuso de autoridade, conluio entre o juiz Moro e os procuradores de Curitiba. A decisão da Segunda Turma, conforme garantia do ministro Gilmar Mendes, era apenas referente ao triplex do Guarujá. Os demais processos continuariam noutras instâncias. Nenhum deles, porém, foi à frente.
Não tem lógica conceder o asilo, muito menos mandar um avião pegar a refugiada em Lima. A decisão se enquadra na visão política dos que consideram que a Lava-Jato foi uma ação de perseguição contra Lula, empresários e políticos governistas daquela ocasião. A ex-primeira-dama peruana deve ter sido considerada perseguida política, nos termos em que as delações premiadas da Lava-Jato foram consideradas, por decisões monocráticas de juízes do Supremo, inválidas porque feitas sob tortura psicológica. A delação do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, que também incriminava o então presidente peruano, foi anulada pelo ministro Dias Toffoli. As delações, porém, valem no Peru e noutros países. Como dar asilo a alguém acusado de corrupção? Acusação de corrupção não tem nada a ver com política — ou tem, na visão do PT.